Transformações pós-pandêmicas

19/04/2022

Foram inúmeras as transformações ocorridas desde a pandemia. Algumas boas, outras frustrantes. Da minha parte, ainda que eu seja fã do "home office", sinto muita falta dos encontros presenciais em SP. Mas, dentre as mais importantes vale destacar:

  1. 1. Uma maior presença de pessoas físicas nas bolsas globais.
  2. 2. As "BIG TECHs" como porto seguro em substituição aos "treasuries".

Estas duas transformações tem tudo a ver com a intensificação do processo de digitalização ocorrido durante a pandemia. Confesso que até hoje tenho dificuldades em conceber a existência de quase 4 milhões de CPFs cadastrados na B3. Digo isso, pois o mundo que habito -- este associado a negociação de opções de Petrobras PN e Vale ON -- não sofreu nem de perto o impacto sugerido por tal aumento de participação. Uma rápida olhada no número de titulares e lançadores destes contratos e conclui-se que este mercado permanece do mesmo tamanho que tinha no período pré-pandêmico. Então, para onde foram os novos entrantes? Bem, este tema é vasto e merece até um texto exclusivo. O meu objetivo no texto de hoje é enfatizar a segunda transformação.

Aqueles que se livraram dos títulos do tesouro dos EUA de longo prazo e compraram ações das "Big Techs" se deram bem. Veja o gráfico abaixo. Na linha verde temos o preço das ações da Apple -- a líder entre as Big Techs. Já na linha azul, temos o ETF TLT que engloba "treasuries" de prazos superiores a 20 anos.

Como podemos ver acima, este talvez tenha sido o grande "trade" dos últimos 12 meses para aquele que curte uma operação "long/short". E olhe que isso é válido não só nos EUA, mas também em quase todo o ocidente. Afinal, estamos em um período inflacionário e os BCs deste lado do mundo hesitaram diante da necessidade de promover um ajuste monetário. (o Brasil é uma exceção e vem sendo recompensado por isso). Mas, paira a seguinte dúvida: com os treasuries de 30 anos rendendo 2,99% neste momento e com a Apple valendo 2,7 trilhões de dólares, será que as "Big Techs" ainda representam um porto seguro?

A busca por ativos reais em períodos inflacionários não é algo novo. No entanto, o que observamos nos últimos dois anos foi certamente algo inusitado. Vimos uma procura desenfreada por ações de um grupo de empresas (as "Big 7" do S&P 500) que fez com que o somatório de valor de mercado do grupo superasse o valor de mercado dos treasuries de 10 anos em circulação. Neste momento, tal somatório é também maior do que o valor de mercado de todas as empresas alemãs.

Curiosamente, no Brasil ocorre o oposto. Está certo que não temos um setor de tecnologia que se compare ao americano. Mas, as nossas grandes empresas (as maiores do IBOV) negociam bem descontadas em termos relativos. Em um passado não muito distante, as ações da Petrobras negociavam com um múltiplo de EV/EBITDA de 5x a 6x. O mesmo pode ser dito a respeito das ações da Vale.

De volta às ações da Big 7 dos EUA, o leitor já deve imaginar a minha desconfiança com relação a este cenário. Não vou me surpreender se, em breve, as ações da Apple se tornarem uma importante fonte de "carry trade" para o mercado; isto é, o mercado passar a "fazer caixa" vendendo ações da Apple para comprar outras ações descontadas ao redor do mundo.

Marink Martins

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