Mentiras e complacência
Em confrontos entre regimes democráticos (ocidente) e ditatoriais (Rússia/China), um problema é que o lado democrático tem a necessidade política de comemorar cada vitória.
Assim, Biden em seu discurso do Estado da União praticamente "cantou" vitória junto ao eleitorado americano que já se mostra cético quanto ao seu governo - o percentual que aprova seu governo caiu de 42% para 37% nos últimos meses, conforme a taxa de inflação vem atingindo níveis preocupantes.
Ao acompanhar a mídia financeira dos EUA percebe-se que os americanos observam toda esta tensão geopolítica como algo que tende a beneficiar a economia americana. Afinal, há vitórias do ponto de vista energético, agrícola e de defesa.
Acima, observamos a escalada no preço da ação da empresa de defesa americana, Lockheed Martin, ao longo do ano de 2022.
Pouco se discute a respeito de possíveis riscos advindos destas tensões.
Dentre os riscos, vale destacar alguns mais óbvios:
- A possibilidade de uma recessão europeia.
- A possibilidade de que investidores estrangeiros poderão se desfazer de ativos nos EUA e repatriar seus recursos.
- A possibilidade de que a intervenção/sanções seja negativa para o dólar (no longo prazo).
Nos EUA fala-se bastante sobre a possibilidade de um ataque cibernético. No entanto, tal tema é sempre apresentado como uma oportunidade; nunca como um risco de destruição de uma determinada atividade econômica.
Não é de hoje que demonstro por aqui as minhas críticas a complacência americana.
Uma mudança de postura em direção a um maior conservadorismo certamente não virá do governo Biden, nem da mídia financeira. Ambos têm sua própria agenda microeconômica.
Uma surpresa poderia vir de Powell e seus amigos do FOMC. Ontem, perguntado pelo senador Richard Shelby se ele seguiria os passos percorridos por Paul Volcker durante os anos 80 para conter a inflação, o chairman disse que SIM.
Em uma segunda pergunta, Shelby perguntou se Powell faria o que fosse necessário para ancorar as expectativas de inflação. E, mais uma vez, o chaiman disse que SIM.
Confesso que quando ouvi as respostas de Powell, logo pensei: o S&P 500 vai despencar. Até que o índice chegou a cair um pouco (de 4390 para 4355), mas se recuperou logo em seguida.
Será que tudo isso é mais um caso de complacência por parte dos investidores? Ou será que o mercado está convicto de que Powell está mentindo?
Será que teremos um "whatever it takes" REVERSO por parte de Powell? Será Powell um Anti-Mario Dragui?
Marink Martins
p.s. Mario Draghi foi chairman do Banco Central Europeu e, em 2012, ficou famoso ao dizer que faria o que fosse necessário ("Whatever it takes") para salvar o euro. O questionamento no texto acima é se Powell vai fazer o que for necessário para ancorar as expectativas de inflação.